20100629

Viajo porque preciso, volto porque te amo


De Karim Ainouz e Marcelo Gomes



A terra dá lugar ao homem. O homem é feito da terra e viaja por ela, descobrindo-a e vivendo-a junto aos nossos dramas e alegrias. O filme nos apresenta uma paisagem desolada, vista por um homem desolado. A terra vista pelos olhos de quem a cria, assim como cada olho pinta a sua própria paisagem. Joga os tons, em música e cor, de uma cena humana específica, coerente com o drama de cada um de nós, que, em momentos de dificuldades, nos sentimos desamparados como se sozinhos em meio a um sertão.

Muitos nem o vêem, dentro de seu carro, isolado em sua pesquisa - falo do personagem e do autor. O geólogo e o cineasta, ambos escondidos, observando um ambiente ao qual eles não pertencem mas que ao mesmo tempo os incita, os acolhe e os abarca em suas próprias jornadas de descobrimento. A viagem no sertão é para os dois, para todos, para nós e para a câmera, para a paisagem e os seres. O canal é política, a salvação de um povo amargurado pela seca, a viagem é a salvação de um homem amargurado pela vida, pelo amor. O canal leva a vida, o geólogo prepara o canal, o cineasta vê a vida, a vida se mostra pela câmera.

A realidade não esconde a vida, nós a escondemos dentro de nós. A solidão nos faz buscá-la. A tristeza nos volta para dentro, a viagem nos volta para fora. As linhas da terra escrevem o tempo em um eixo que não conseguimos ler. As dimensões de nossos dramas são ranhuras de um relevo escarpado. O brega é absolvido, todos nós somos. Em uma indiferença absoluta nos entregamos a nossos caminhos, a nossos traços e arranhões, trejeitos e tragédias. Traçando relevos através dos quais a água escorre, como lágrimas ou suor, trazendo sempre, junto de si, a vida.

Pedro Salim